terça-feira, maio 7

Here comes the sun

Queridos não-leitores, grandes amigos e fãs em geral. Volto a republicar as páginas passadas (com os nomes nas suas iniciais, para preservar as pessoas e a privacidade mundial) e escrever novo textinho, inspirado nas novas experiências que estou tendo (produtos das novas viagens, tema que motivou o início deste blog). Fui pra Dinamarca a trabalho e não me deu muito tempo de conhecer a cidade onde fiquei (Copenhague). Mas pelo que vi da janela do ônibus e do meu hotel, ali se vive nestes dias aquele espírito lindo de primavera na Europa. As pessoas saindo nas ruas, se espichando nos parques e gramados, os passarinhos cantando, todo mundo começando a sorrir, uma coisa que a gente não sente muito aqui, pois o clima aqui é de eterno verão, graças a Deus.

Hoje, depois de um tempo parado, retomei minha corrida (que espero ser diária) no parque perto da minha casa. A minha empolgação com a vida em geral e a primavera européia, me fez acordar no meio da madrugada, (pra dar tempo de sair no mesmo horário que estou saindo para o trabalho), e tudo ainda estava muito frio e escuro. Foi dose chegar até o parque. Mas fui ouvindo música e me embalei na corrida.

Depois, na volta, estava com aquele bem-estar que ficamos depois do exercício, o solzinho começou a aparecer, e lindamente começa tocar uma música dos Beatles, composta pelo George Harrison quando ele tava tomando sol no jardim do casarão do Eric Clapton. Sou vidrado no Abbey Road, dos Beatles. O disco inteiro tem uma unidade, músicas lindas e pesadas que se intercalam dando o balanço que tem um pouco a ver com a nossa vida. Ela sobe e desce, bonita e feia, mas linda no final (and in the end, the love you take is equal to the love you make).

Enfim, começou a tocar a "Here comes the sun", bem quando eu tava passando pelo lado ensolarado da rua nesta manhã. Mágico mesmo. E pensei no disco e em mim. Golden Slumbers, música super linda, meio canção de ninar, é sucedida no disco pela pesada "Carry that weight". Depois do ninar vem a vida real, as porradinhas que a gente leva por acreditar nas coisas.

Mas continuando na série "Beatles explicando a vida", numa outra sequência, a que mais agrada no momento, vejo que a música " I want you (she`s so heavy)" que tem sete minutos de desepero e chatice, é sucumbida pela leve, ensolarada e agradável "Here comes the sun".

Bom, é isso aí. É isso aqui:

Here Comes The Sun
(George Harrison)

Here comes the sun,
Here comes the sun, and I say
it's all right

Little darling, it's been a long cold lonely winter
Little darling, it feels like years since it's been here
Here comes the sun,
Here comes the sun, and I say
it's all right

Little darling, the smiles returning to the faces
Little darling, it seems like years since it's been here
Here comes the sun,
Here comes the sun, and I say
it's all right

Sun, sun, sun, here it comes...
Sun, sun, sun, here it comes...
Sun, sun, sun, here it comes...
Sun, sun, sun, here it comes...
Sun, sun, sun, here it comes...

Little darling, I feel that ice is slowly melting
Little darling, it seems like years since it's been clear
Here comes the sun,
Here comes the sun, and I say
it's all right

Here comes the sun,
Here comes the sun, and I say
it's all right
it's all right

Ufa! Foi uma semana!


Agora só faltam 44.

O vento

Los Hermanos

Posso ouvir o vento passar,
assistir à onda bater,
mas o estrago que faz
a vida é curta pra ver
Eu pensei
Que quando eu morrer
vou acordar para o tempo
e para o tempo parar:
Um século, um mês,
três vidas e mais
um passo pra trás?
Por que será?
Vou pensar.

Como pode alguém sonhar
o que é impossível saber?
Não te dizer o que eu penso
já é pensar em dizer
e isso, eu vi,
o vento leva!
Não sei mais
sinto que é como sonhar
que o esforço pra lembrar
é a vontade de esquecer
E isso por que?
Diz mais!
Uh... Se a gente já não sabe mais
rir um do outro meu bem então
o que resta é chorar e talvez,
se tem que durar,
vem renascido o amor
bento de lágrimas.
Um século, três,
se as vidas atrás
são parte de nós.
E como será?
O vento vai dizer
lento o que virá,
e se chover demais,
a gente vai saber,
claro de um trovão,
se alguém depois
sorrir em paz.
Só de encontrar... Ah!!!

Roda Viva

Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu...
A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega o destino prá lá ...
Roda mundo, roda gigante
Roda moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração...
A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir
Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda viva
E carrega a roseira prá lá...
Roda mundo, roda gigante
Roda moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração...
A roda da saia mulata
Não quer mais rodar não senhor
Não posso fazer serenata
A roda de samba acabou...
A gente toma a iniciativa
Viola na rua a cantar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega a viola prá lá...
Roda mundo, roda gigante
Roda moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração...
O samba, a viola, a roseira
Que um dia a fogueira queimou
Foi tudo ilusão passageira
Que a brisa primeira levou...
No peito a saudade cativa
Faz força pro tempo parar
Mas eis que chega a roda viva
E carrega a saudade prá lá ...
Roda mundo, roda gigante
Roda moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração...

Baêa

Depois de ficar 20 dias de aeroporto em aeroporto, indo e voltando de continentes (7 cidades diferentes no total), acompanhando meio mundo, em infinitas agendas, línguas diferentes, hoje acordei, com-fuso, às 7 horas,sozinho, na minha querida cama.
Depois de achar minimamente uma roupa mais ou menos própria (preciso urgentemente comprar sabão em pó!) vim ao trabalho, ouvindo afro-sambas.
Puta disco.
Não sei porque, mas me deu uma senhora vontade de ir pra Bahia, que conheço só de ficar dois dias em um hotel.
Nesses dias, nos aviões e trens-bala da vida tinha ouvido também muito João, Gil, Dorival e Novos Baianos.
Vontade de ir pro interior primeiro, Caraíva da vida, ficar em pousadinha, dançar forró-dois-pra-lá-dois-pra-cá, depois ir pra praia e tomar água de côco. Depois ir pra Santo Amaro da Purificação (terra do Caetano, Betania, Dona Canô), andar pela cidade de chinelo e se der, ouvir um sambinha de roda.
Se desse também gostaria de ir pra Mangue Seco, terra da Tieta, andar nas pracinhas, dormir nas dunas ouvindo o sino das cabras.
Por fim ficar uma semana inteira em Salvador, de branco (sei que é caricato, mas que vontade). Jogar búzios com a mãe de um grande amigo meu. Ficar andando aquele centro de salvador, depois andar o rio vermelho, ir na casa do Jorge Amado, Abaeté, Itapuã....
Enfim, tudo isso.
E se pudesse, já que estamos sonhando, fazer cada coisa com umas pessoas que me lembram muito esses lugares. Bia, Laio e Jean.
Beijos e saudade.

Aqueles olhos verdes

Impressionante o poder que aqueles olhos verdes podem exercer numa pessoa. Se estão sorrindo me fazem brilhar, se estão fechando, me fazem sonhar, se estão sérios me fazem parar.
Nada se compara em abrir meus olhos e vê-los, primeira coisa ao acordar.
A gente até pode imaginar o que de melhor poderia nos acontecer, mas às vezes a vida (que é uma "bitch" na maioria das vezes, como diria meu amigo Nélio), nos dá presentes maiores do que poderíamos conceber.
Olhos de dançar bolero agarradinho, de levitar leve. De voar.
T.A.


PS: pensei em colocar aqui uma foto de olhos verdes, mais para ilustrar. Mas não seria justo com os olhos verdes reais homenageados, mais bonitos do que qualquer um. E quando o sol bate, ficam amarelos, que nem gatão do mato.

Carta para Bica


Bica,
fiquei radiante ao receber o telefonema da mamãe hoje às 6hs. Não consegui mais dormir, tentando imaginar a carinha da Teresa, depois de tanta expectativa.
Coincidência ou não, tenho marcado muitas reuniões em São Paulo nas últimas semanas para sempre ficar mais perto caso alguma novidade aconteça.
E nesta sexta, hoje, tinha marcado uma reunião lá na Paulista, do lado do Promatre.
Ou seja, acabando já tô lá pra te ver.
Desde manhã tenho pedido bastante pro nascimento ser ótimo e pra você sofrer o menos possível, e para a bebê vir linda, saudável e esperta, do jeito que ela será.
A dimensão da notícia de hoje de manhã encobre tudo Bibi. Ver você, irmãzinha que vi crescer e cresci junto, tendo a sua filhinha, que aposto será tão maravilhosa quanto você é, quanto o Manú é, é muito maravilhoso.
A gente começa a ver a vida de uma outra maneira, depois de termos crescido e amadurecido, depois de termos perdido os avós e tios queridos que tantas coisas nos passaram, vermos os pais envelhecendo tão lindamente e dignamente, agora começamos ver a outra geração depois da gente. Dá o sentido do que foi passado pra gente e do que a gente vai passar pra eles, da nossa missão por aqui. Da grandeza desse amor imenso que vem de gerações e agora passa por nós, e que tenho certeza continuará se multiplicando- amor, bondade, caráter, gentileza, respeito, carinho.
É muito bonito isso mana.
É o grande sentido da vida.
Fico radiante por vocês.
E estou aqui pro que quer que seja.
Sempre
Te amo
Beijo
Fe

terça-feira, janeiro 12

A vida quer é paciência....

Vivemos em um momento de falta de perspectiva, falta de ideias inspiradoras, falta de lideranças e falta de organização popular. Estamos fartos de faltas.

Apesar de assistirmos a ensaios que apontam para novidades interessantes nos movimentos populares, como as marchas das mulheres contra Cunha e a resistência dos estudantes secundaristas de São Paulo, eles ainda se mostram embrionários e isolados, ainda sem força para mudar a conjuntura política de nosso país. No entanto, esses movimentos foram como vulcões. Erupções de movimentos sociais ainda subterrâneos.

As mudanças sociais do Brasil desde a redemocratização brasileira foram as causas desse processo ainda em gestação, mas irreversível. A estabilidade econômica, a responsabilidade fiscal, a inédita diminuição da desigualdade com crescimento, a abertura do diálogo com diversos setores da população, a formação de conselhos para elaboração de políticas nacionais, foram muitos dos avanços notáveis que acabaram provocando a mudança de paradigmas que estamos passando - todos eles resultantes do longo período de democracia que vivemos desde os anos 80.


As mutações estruturais em nossa sociedade, porém, não se revelarão instantaneamente. São processos que demoram o tempo que a História exige para se solidificarem. A esquerda, a direita, o centro, todos os espectros políticos tradicionais não já respondem mais aos novos tempos que virão, expressos pelos urros de inconformismo com o presente-passado.

É daí que vem a insatisfação generalizada com a política em geral, refletida ainda mais com a sua expressão maior. O governo de Dilma Rousseff, assim como o de Alckmin e a maioria dos outros ainda não refletem o futuro irreversível que passaremos, assim como não farão os próximos governantes que virão, muito provavelmente aventureiros ou antiquados. As mudanças sociais ainda não se refletirão na política tradicional por um bom tempo. Um acúmulo de lutas ainda precisará amadurecer e aparecer coerentemente.

O discurso do primeiro governo Dilma apontou para isso. A seleção do trecho do Grande Sertão Veredas não poderia ser mais profética para definir os anos Dilma, marcados pelo refluxo provocado pelos avanços em governo anteriores. Esse é um período de gestação, que esfria, afrouxa, que sossega.  

Disse ela em seu primeiro dia de governo: "O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois inquieta. O que ela quer da gente é coragem."

A presidenta "coração valente", ao citar Guimarães Rosa, acertou o diagnóstico, mas errou na receita. O que falta para o momento, mais do que coragem, é paciência.
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quarta-feira, agosto 19

Dolce Vita

Imagina que você acorda em um lugar diferente do que costuma acordar. Uma cama baixa, mas na altura exata para o seu pé. Você abre os seus olhos e sua cabeça está afundada em um travesseiro macio onde você está afundado. 
Ao seu lado está uma mulher linda que sorri para você. Seus olhos verdes e seu sorriso devastador te dão uma paz interior gigantesca.
Você levanta depois de uma surpresa matinal, levanta, e ao se espreguiçar percebe que cada músculo e osso do seu corpo está no lugar certo. Nenhuma grama a mais. Todo o seu corpo está no seu devido lugar. Como nunca. Inspira longamente espichando os braços e vê que é flexível como um gato.
Vai ao banheiro branco, sente a água morna molhar sua nuca, e se esfrega com um sabão refrescante com cheiro de mato.
Após o banho, toma o seu café em um deck que dá para uma montanha inacreditavelmente verde, respira fundo e o ar que entra em seu corpo é fresco e úmido, cheirando a grama molhada. Come as frutas mais deliciosas, vindas do pé, do quintal e jardim do andar de baixo, onde seus cachorros brincam.
Após o café você lê os jornais do dia, ao som de uma música agradável e acolhedora. Depois disso, começa a fazer o seu trabalho, sem sair de casa, em um escritório que dá para o jardim. Ao fundo sua mulher nada na piscina de água mineral, e depois toma o sol agradável das 8 horas. Nua.
Assim que termina suas primeiras obrigações diárias, levanta e segue por uma trilha, onde anda para pensar um pouco na vida, no que fez, no que fará.
Você volta, escreve mais um pouco, lê mais um pouco.
Antes do almoço, pára para tocar seu instrumento preferido. Depois de duas novas músicas, almoça uma salada de folhas frescas saídas do pé. O omelete é feito com ovos da granja. O queijo é das cabras que cantam durante todo o dia.
Para descansar do almoço, você cochila por quarenta minutos em sua rede. Acorda assobiando, tentando lembrar todas as ideias que lhe apareceram no sonho.
Volta ao seu trabalho, escreve mais um pouco. Muitos bons insights.
Por hoje é só. Agora quem nada na piscina branca com ladrilhos de fórmica azul é você. E a tarde começa a cair, e você bóia na piscina ouvindo aquela música tocando ao fundo que sonora o pôr do sol. 
Deitado na bóia encontra o braço de sua mulher, também deitada sob a água.
Vocês sorriem e partem para a ópera. Ela com o seu vestido mais bonito, aperta a sua mão como se fosse grudar os corpos em uma só alma. Vocês choram com aquela beleza toda.
Felizes, jantam e conversam por toda noite. O vinho lhe alegra a orelha.
Voltam para casa flutuando, e dormem inseparáveis, afundados no colchão e nos lençóis.
Você abre os olhos, assustado com a gritaria da rua e com o alarme do carro.

quinta-feira, março 26

 
  **footnote: Thanks to Bilal for this comic idea!

quarta-feira, março 25

Dilma/Temer ou Temer/Dilma

Pois é, depois de uma das campanhas mais apertadas em toda história presidencial brasileira, com um resultado péssimo no legislativo, a presidenta Dilma (com base de apoio no PMDB) decidiu pela "governabilidade". Depois de se jogar para a esquerda durante a campanha, valorizando as políticas sociais e econômicas de seu primeiro governo, a presidenta eleita foi fotografada carregando pra cima e pra baixo o último livro da trilogia sobre Getúlio, de Lira Neto. 

Pode ser também influenciada por isso, e levando em consideração a conjuntura muito parecida com os últimos dias de GV (falta de apoio político no Congresso, crise política envolvendo a questão do petróleo e da Petrobrás, oposição maciça e dura da grande imprensa), Dilma escolheu um ministério de coalizão, bastante em desalinho com o discurso de campanha. Nomes como Gilberto Kassab pra cuidar da agenda urbana das cidades brasileiras, Kátia Abreu para cuidar da agricultura e Joaquim Levy para cuidar da Fazenda.

Para melhorar ainda mais tirou todos os nomes restantes ligados ao antigo presidente Lula, colocou um nome sem peso político e discurso relevante no Itamaraty (mais subfinanciado do que nunca), começou cortando os gastos pelos sociais, como o seguro desemprego, além de aumentar a luz e energia.

Enfim, lançou candidato próprio a presidência da Câmara e contra o candidato peemedebista, se contrapondo ao maior partido de sua base. E perdeu.

Considerando a história política do país (nunca nenhum período democrático durou mais do que o atual no Brasil) e a conjuntura atual (crises de corrupção, falta de apoio político na Câmara, Senado (um pouco melhor) e no Supremo, tudo se encaminha para o impeachment. É o que a grande mídia reverbera, é o que os juristas mais conservadores justificam legalmente, e é o que os políticos, inclusive os da base conservadora do governo, começam a desenhar (criação da CPI da Petrobrás, etc.).

Somado a tudo isso não há força nem vontade para que os grupos que foram fundamentais para a eleição de Lula (juventude, minorias e movimentos sociais) continuem defendendo o segundo governo Dilma. Ou alguém tem alguma dúvida que a grande massa da CUT vai sair com força nas ruas para defender o governo que corta o seguro desemprego? Ou que o MST vai fazer uma onda vermelha para defender a Katia Abreu? Ou que os movimentos de moradia ou pelo transporte público gratuito sairão nas ruas para defender a continuidade das políticas urbanas tocadas pelo Kassab? 

O cenário, que parece dramático, não é tanto. Explico: Imaginemos que todo esse cenário realmente aconteça. Consideremos que assuma Temer (antes de dois anos, teria que convocar novas eleições). Mas se assumisse passados dois anos, daqui a um ano e meio (depois do Congresso liderado por Cunha e Calheiros fazerem a reforma política como propõe o próprio Temer e colocarem na pauta assuntos como o enterramento do aborto ou casamento e adoção gay).

Suponhamos que assuma Temer, após um ano e meio de descobertas de corrupção, massacre midiático e o que de mais retrógrado em leis serem aprovados. Como seria esse governo Temer. possivelmente depois de uma crise seria um governo de coalizão. Para isso ele teria que buscar apoio de todas as forças políticas disponíveis. Parecido com alguma coisa?

Vislumbro um governo Temer pós-impeachment com um perfil liberal na economia (bem visto pelo mercado e pela mídia, com perfil de corte de gastos sociais e privatizador). Assume na Petrobrás um nome de confiança internacionalmente conhecido: minha aposta seria Henrique Meirelles, ou Pedro Malan (o que dá mais ou menos no mesmo).

Para as cidades um político de carreira, com bom trânsito no Congresso e com as grandes forças do mercado: construtoras, empresas de ônibus e lixo (palpite: Gilberto Kassab).

Para os esportes, pasta de menor importância, poderia ser assumida por um nome que trouxesse apoio político. Poderia mesmo ser alguém da bancada evangélica, isso não seria prioridade de um governo Temer, poderia ser peça de barganha.

Para o ministério da Agricultura alguém que seja do gosto dos grande latifundiários e do próprio PMDB: Katia Abreu.

Para o ministério da Educação, alguém com perfil e discurso mais à esquerda, mas que tenha cintura suficiente para fazer as concessões. Seria bom alguém com base no Nordeste e passado de diálogo com os coronéis, tão queridos pelo PMDB. Que tal Ciro Gomes (ex-PSDB, ex-PSB, ex-PPS, ex-PMDB...). Pode ser ainda que o PMDB quisesse trazer parte da base da esquerda para o seu lado. Um nome forte seria Cristóvão Buarque.

Para a saúde um nome com perfil mais técnico, talvez Temporão. Ou melhor ainda, alguém que fosse uma boa vitrine para a área, que lançasse marcas estridentes e que fosse um nome de força: José Serra.

Para a articulação política qualquer um dos indicados por Cunha, Temer, Renan. Nome forte seria o ressuscitado presidente Sarney. De volta á carga para garantir uma reeleição para algum nome do PMDB em 2018. Quiçá Aécio Neves, em disputa interna no PSDB com Alckmin para a presidência, fosse ao PMDB para ser o nome de consenso, refazendo o caminho de seu avô à presidência, pelo mesmo partido.

Para o Meio Ambiente, ou o Itamaraty (o que escolher), nome forte seria Marina Silva. para qualquer uma das duas pastas um nome como esse levaria visibilidade e orçamento para essas políticas. Coisa que hoje em dia, não há. Há altivez sem capacidade (vide artigo do próprio Celso Amorim, dizendo que não se faz política externa sem apoio, visão e orçamento).

Para o Desenvolvimento Social o PMDB traria (como já havia trazido com Itamar) um nome de respeito na área, além de se aproximar do PSB: minha aposta seria Luisa Erundina.

Se essas elucubrações estivessem certas, nota-se que um possível governo Temer pouco mudaria (quando pensamos em prioridades políticas) do que se desenha o segundo governo Dilma. Ele seria ainda um governo com menor crise no legislativo, com maior apoio de todas as forças políticas (poderosas) do país e com maciço da grande imprensa e grandes interesses do capital nacional e internacional.

Talvez os únicos que perderiam seriam os excluídos e minorias. Mas estes já não foram levados em conta na governabilidade do atual segundo governo Dilma.

Tomara que eu esteja completamente errado.    

terça-feira, março 27

Sentimental Trombone

E quando entrei no apartamento, pela primeira vez depois de feito o negócio, há uns dois anos já, senti um cheiro de velho.Carpete verde claro gasto e marcado pelos móveis que não estavam mais lá, paredes encardidas e com cimento aparente em alguns trechos, portas gastas e fios de lustre cortados com faca.

A primeira coisa que levei foi um incenso e meu rádio.

O que iria colocar de meu lá, em primeiro lugar, era a música, que aos poucos limparia o ambiente carcomido pela história dos anos. Pensei em colocar no "aleatório" do Ipod e deixar o acaso escolher a primeira música da minha futura primeira casa.

E ele quis que fosse Tommy Dorsey, "I'm getting sentimental over you". Liguei o cubo de luz que também tinha levado, sentei no carpete velho, olhei praquilo tudo e fiquei ouvindo aquela música melancólica e linda, até a luz da tarde sair da janela da sala.

A música parecia ter sido escolhida pelos antigos donos, que não estavam mais fisicamente lá. Pra mim pareceu um ritual de passagem, com o meu rádio homenageando quem tinha vivido por tanto tempo por lá e me apresentando ao apartamento.

Hoje em dia consigo ouvir tudo naquela mesma sala, agora com uma luz vermelha tingindo as paredes cheias de quadros e fotos minhas, sem ter que me sentir pedindo licença. Vai de Jimi Hendrix a Dilermando Reis.

Aos poucos um lar vai se formando. E o apartamento vai se tornando mais eu.

quinta-feira, março 1

Getting Better

Devo admitir, acordar sem ter dormido tudo o que se quer, correr que nem um Ayrton Senna nas Dutras da vida, inventar pratos exóticos com jiló, assistir filmes esquisitos e revoltantes, tudo isso poderia ser angustiante, não? Mas não é. Deixar de pensar em coisas maiores e difíceis e só pensar em coisas boas e presentes, voltar a falar com amigos com tudo pra se dizer, tocar aquela música, fazer aquela cesta, colocar aquele disco. A volta do assunto nos bares da vida, a volta do brilho nos olhos. Devo admitir, tá ficando melhor, cada vez mais. 

quarta-feira, fevereiro 15

Jazz

E sorveu mais um gole do vinhozinho que caía tão bem naquela noite chuvosa. Amarrava um pouco, mas depois da terceira taça começou a lhe agradar. O disco era ótimo pra acompanhar. Nenhuma mulher cantará tão bem, tão sofrido e tão lindamente quanto a Lady Day. Lembrou daquele amigo que sempre falava isso. Lembrou da música do Gill-Scott Heron que falava dela, depois lembrou da "Sir Duke".
Da terceira pra quarta taça lhe bateu uma certa náusea, não alcóolica, mas existencial. Lembrou o Roquentin quando ouvia o jazz. Um dos seus livros preferidos.
Como em Sartre, na hora do jazz, naquela hora, tudo não fez mais sentido, e ao mesmo tempo, tudo se aquietou, numa calma avassaladora.
E desde então, Sophisticated Lady não lhe sai da cabeça.

quinta-feira, fevereiro 2

Centro de São Paulo: pra quem?

A primeira vez que vi a Ermínia Maricato foi no Fórum Social Mundial no ano passado, em uma atividade em Canoas. A mulher me assombrou, fez uma fala linda sobre a exclusão dos pobres dos grandes centros, a luta pela moradia e terminou super empolgada gritando, falando sobre a necessidade de reação das camadas pobres prejudicadas: "Porque a gente não vai pra porrada?! Porque não vai pra porrada??!!"
foi lindo

Agora diante das cracolândias da vida, ela também escreve esse belo artigo, publicado na Carta Maior.


Terror imobiliário ou a expulsão dos pobres do centro de São Paulo

O modelo é contra os pobres que estão longe de constituírem minoria em nossa sociedade. O modelo quer os pobres fora do centro de São Paulo. Isso é óbvio. O que não parece ser óbvio é que, em última instância, a determinação disso tudo é econômica. A centralidade é a produção do espaço urbano e a mola propulsora, a renda imobiliária. E depois dizem que Marx está morto.

Ermínia Maricato, na Carta Maior

Dificilmente, durante nossa curta existência, assistiremos disputa mais explícita que esta, que opõe prefeitura e Câmara Municipal de São Paulo (além do governo estadual), que representam os interesses do mercado imobiliário, contra os moradores e usuários pobres, pelo acesso ao centro antigo de São Paulo. Trata-se do único lugar na cidade onde os interesses de todas as partes (mercado imobiliário, prefeitura, Câmara Municipal, comerciantes locais, movimentos de luta por moradia, moradores de cortiços, moradores de favelas, recicladores, ambulantes, moradores de rua, dependentes químicos, e outros) estão muito claros, e os pobres não estão aceitando passivamente a expulsão.

No restante da cidade, como em todas as metrópoles brasileiras, um furacão imobiliário revoluciona bairros residenciais e até mesmo as periferias distantes, empurrando os pobres para além dos antigos limites, insuflado pelos recursos do Minha Casa Minha Vida no contexto de total falta de regulação fundiária/imobiliária ou, em outras palavras, de planejamento urbano por parte dos municípios. A especulação corre solta, auxiliada por políticas públicas que identificam valorização imobiliária como progresso.

Ao contrário do silêncio (ou protestos pontuais) que acompanha essa escandalosa especulação que, a partir de 2010, levou à multiplicação dos preços dos imóveis, em todo o país, no centro de São Paulo, foi deflagrada uma guerra de classes.

Não faltaram planos para recuperar o centro tradicional de São Paulo. Desde a gestão do prefeito Faria Lima, vários governos defenderam a promoção de moradia pública na região. Governos tucanos apostaram em estratégias de distinção local por meio de investimento na cultura (como demonstraram muitos trabalhos acadêmicos) Vários museus, salas de espetáculo, centros culturais, edifícios históricos, foram criados ou renovados. No entanto, o mercado imobiliário nunca respondeu ao convite dos diversos governos, de investir na região, seja para um mercado diferenciado, seja para habitação social como pretenderam os governos Erundina e Marta.

Outras localizações (engendradas pelas parcerias estado/capital privado, como demonstrou Mariana Fix) foram mais bem sucedidas como foi o caso da região Berrini/Águas Espraiadas. Outro fator que inibiu a entrada mais decisiva dos empreendedores no centro foi a reduzida dimensão dos terrenos. O mercado imobiliário busca terrenos amplos que permitam a construção de uma ou de várias torres- clube, padrão praticamente generalizado atualmente no Brasil.

Finalmente, há os pobres – com toda a diversidade já exposta – cuja proximidade desvaloriza imóveis novos ou reformados, coerentemente com os valores de uma sociedade que além de patrimonialista (e por isso mesmo) está entre as mais desiguais do mundo. Aceita-se que os pobres ocupem até áreas de proteção ambiental: as Áreas de Proteção dos Mananciais (são quase 2 milhões de habitantes apenas no sul da metrópole), as encostas do Parque Estadual da Serra do Mar, as favelas em áreas de risco, mas não se aceita que ocupem áreas valorizadas pelo mercado, como revela a atual disputa pelo centro.

Enquanto os planos das várias gestões municipais para o centro não deslancharam (leia-se: não interessaram ao mercado imobiliário), os serviços públicos declinaram (o acúmulo de lixo se tornou regra), num contexto já existente de imóveis vazios e moradia precária. O baixo preço do metro quadrado afastou investidores e, mais recentemente, nos últimos anos… também o poder público. Nessa área assim “liberada” e esquecida pelos poderes públicos, os dependentes químicos também se concentraram. No entanto a vitalidade do comércio na região, que inclui um dos maiores centros de venda de computadores e artigos eletrônicos da América Latina, não permite classificar essa área como abandonada, senão pelo falta de serviços públicos de manutenção urbana e políticas sociais.

Frente a isso, a gestão do prefeito Kassab deu continuidade ao projeto NOVA LUZ, iniciado por seu antecessor, José Serra, e vem se empenhando em retirar os obstáculos que afastam o mercado imobiliário de investir na área. Estão previstos a desapropriação de imóveis em dezenas de quadras e o remembramento dos lotes para constituírem grandes terrenos de modo a viabilizar a entrada do mercado imobiliário.

A retomada de recursos de financiamento habitacional com o MCMV, após praticamente duas décadas de baixa produção, muda completamente esse quadro. Os novos lançamentos do mercado imobiliário passam a cercar a região. Vários bairros vizinhos, como a Barra Funda, apresentam um grande número de galpões vazios em terrenos de dimensões atraentes. A ampliação de outro bairro vizinho, Água Branca, vai se constituir em um bairro novo .

Finalmente, o mercado imobiliário e a prefeitura lançam informalmente a ideia de uma fantástica operação urbana que irá ladear a ferrovia começando no bairro da Lapa e estendendo-se até o Brás. O projeto inclui a construção de vias rebaixadas. Todos ficam felizes: empreiteiras de construção pesada, mercado imobiliário, integrantes do executivo e legislativo (que garantem financiamento para suas campanhas eleitorais) e a classe média que ascendeu ao mercado residencial com os subsídios.

O Projeto Nova Luz parece ser a ponta de lança dessa gigantesca operação urbana.

Mas ainda resta um obstáculo a ser removido: os pobres que se apresentam sobre a forma de moradores dos cortiços, moradores de favelas, dependentes de droga, moradores de rua, vendedores ambulantes… Com eles ali, a taxa de lucro que pode ser obtida na venda de imóveis não compensa.

Algumas ações não deixam dúvida sobre as intenções de quem as promove. Um incêndio, cujas causas são ignoradas, atingiu a Favela do Moinho, situada na região central ao lado da ferrovia. Alguns dias depois, numa ação de emergência, a prefeitura contrata a implosão de um edifício no local sob alegação do risco que ele podia oferecer aos trens que passam ali (enquanto os moradores continuavam sem atendimento, ocupando as calçadas da área incendiada). Em seguida os dependentes químicos são literalmente atacados pela polícia sem qualquer diálogo e sem a oferta de qualquer alternativa. (Esperavam que eles fossem evaporar?). Alguns dias depois vários edifícios onde funcionavam bares, pensões, moradias, são fechados pela prefeitura sob alegação de uso irregular. (O restante da cidade vai receber o mesmo tratamento? Quantos usos ilegais há nessa cidade?).

O centro de São Paulo constitui uma região privilegiada em relação ao resto da cidade. Trata-se do ponto de maior mobilidade da metrópole, com seu entroncamento rodo-metro- ferroviário. A partir dali, pode-se acessar qualquer ponto da cidade o que constitui uma característica ímpar se levarmos em conta a trágica situação dos transportes coletivos. Trata-se ainda do local de maior oferta de emprego na região metropolitana. Nele estão importantes museus e salas de espetáculo, bem como universidades, escolas públicas, equipamentos de saúde, sedes do judiciário, órgãos governamentais.

Apenas para dar uma ideia da expectativa em relação ao futuro da região está prevista ali uma Escola de Dança, na vizinhança da Sala São Paulo, cujo projeto, elaborado por renomados arquitetos suíços – autores do arena esportiva chinesa “Ninho de Pássaro” – custou a módica quantia de R$ 20 milhões de acordo com informações da imprensa. É preciso lembrar ainda que infraestrutura local é completa: iluminação pública, calçamento, pavimentação, água e esgoto, drenagem como poucas localizações na cidade.

Trata-se de um patrimônio social já amortizado por décadas de investimento público e privado. A disputa irá definir quem vai se apropriar desse ativo urbano e com que finalidade. A desvalorização de tal ambiente é um fenômeno estritamente ou intrinsecamente capitalista, como já apontou David Harvey analisando outros processos de “renovação” de centros de cidades americanas.

A luta pela Constituição Federal de 1988 e a regulamentação de seus artigos 182 e 183, que gerou o Estatuto da Cidade, se inspirou, em parte, na possibilidade de utilizar imóveis vazios em centros urbanos antigos para moradia social. Nessas áreas ditas “deterioradas” está a única alternativa dos pobres vivenciarem o “direito à cidade” pois de um modo geral, eles são expulsos para fora da mesma. Executivos e legislativos evitam aplicar leis tão avançadas. O judiciário parece esquecer-se de que o direito à moradia é absoluto em nossa Carta Magna enquanto que o direito à propriedade é relativo, à função social. (Escrevo essas linhas enquanto decisão judicial autorizou o despejo –que se fez de surpresa e de forma violenta- de mais de 1.600 famílias de uma área cujo proprietário – Naji Nahas – deve 15 milhões em IPTU, ao município de São José dos Campos. Antes de mais nada, é preciso ver se ele era mesmo proprietário da terra, já que no Brasil, a fraude registraria de grandes terrenos é mais regra que exceção, e depois verificar se ela estava ou não cumprindo a função social).

É óbvio, que o caso que nos ocupa aqui mostra a falta de compaixão, de solidariedade, de espírito público. Crianças moram em péssimas condições nos cortiços, em cômodos insalubres, dividem banheiros imundos com um grande número de adultos (quando há banheiros). Com os despejos violentos são remetidas para uma condição ainda pior de moradia pelo Estado que , legalmente, deveria responder pela solução do problema. Num mundo com tantas conquistas científicas e tecnológicas, dependentes químicos são tratados com balas de borracha e spray de pimenta para se dispersarem. Um comércio dinâmico, formado por pequenas empresas e ambulantes, que poderia ter apoio para a sua legalização, organização e inovação é visto como atrasado e indesejável. O modelo perseguido é o do shopping center, o monopólio, e não o pequeno e vivo comércio de rua ou o boteco da esquina.

O modelo é contra os pobres que estão longe de constituírem minoria em nossa sociedade. O modelo quer os pobres fora do centro como anunciou o jornal Brasil de Fato. Tudo isso é óbvio. O que não parece ser óbvio é que, em última instância, como diria Althusser, a determinação disso tudo é econômica. A centralidade é a produção do espaço urbano e a mola propulsora, a renda imobiliária. E depois dizem que Marx está morto.

Ermínia Maricato é urbanista.

quarta-feira, janeiro 25

Pinheirinho, Cracolândia e USP: em vez de política, polícia!

23/01/12 por raquelrolnik

Domingo, 22 de janeiro de 2012, 6h da manhã, São José dos Campos (SP). Milhares de homens, mulheres, crianças e idosos moradores da ocupação Pinheirinho são surpreendidos por um cerco formado por helicópteros, carros blindados e mais de 1.800 homens armados da Polícia Militar. Além de terem sido interditadas as saídas da ocupação, foram cortados água, luz e telefone, e a ordem era que famílias se recolhessem para dar início ao processo de retirada. Determinados a resistir — já que a reintegração de posse havia sido suspensa na sexta feira – os moradores não aceitaram o comando, dando início a uma situação dramaticamente violenta que se prolongou durante todo o dia e que teve como resultado famílias desabrigadas, pessoas feridas, detenções e rumores, inclusive, sobre a existência de mortos.



Nos últimos 08 anos, os moradores da ocupação lutam pela sua permanência na área. Ao longo desse tempo, eles buscaram firmar acordos com instâncias governamentais para que fosse promovida a regularização fundiária da comunidade, contando para isto com o fato de que o terreno tem uma dívida milionária de IPTU com a prefeitura. O terreno pertence à massa falida da empresa Selecta, cujo proprietário é o especulador financeiro Naji Nahas, já investigado e temporariamente preso pela Polícia Federal na operação Satiagraha. No fim da semana, várias foram as idas e vindas judiciais favoráveis e contrárias à reintegração, assim como as tratativas entre governo federal, prefeitura, governo de Estado e parlamentares para encontrar uma saída pacífica para o conflito.Com o processo de negociação em curso e com posicionamentos contraditórios da Justiça, o governo do Estado decide armar uma operação de guerra para encerrar o assunto.




03 de janeiro de 2012, região da Luz, centro de São Paulo. A Polícia da Militar inicia uma ação de “limpeza” na região denominada pela prefeitura como Cracolândia. Em 14 dias de ação, mais de 103 usuários de drogas e frequentadores da região foram presos pela polícia com uso da cavalaria, spray de pimenta e muita truculência. Em seguida, mais de trinta prédios foram lacrados e alguns demolidos. Esta região é objeto de um projeto de “revitalização” por parte da prefeitura de São Paulo, que pretende concedê-la “limpinha” para a iniciativa privada construir torres de escritório e moradia e um teatro de ópera e dança no local. Moradores dos imóveis lacrados foram intimados a deixar a área mesmo sem ter para onde ir. Comerciantes que atuam no maior polo de eletroeletrônicos da América Latina, a Santa Efigênia , assim como os moradores que há décadas vivem ali, vêm tentando, desde 2010, bloquear a implantação deste projeto, já que este desconsidera absolutamente suas demandas.



08 de novembro de 2011, 05h10 da manhã, Cidade Universitária, São Paulo.Um policial aponta a arma para uma estudante de braços levantados, a tropa de choque entra no prédio e arromba portas (mesmo depois de a polícia já estar lá dentro), sem deixar ninguém mais entrar (nem a imprensa, diga-se de passagem), nem sair, tudo com muita truculência. Este foi o início do processo de desocupação da Reitoria da Universidade de São Paulo, ocupada por estudantes em protesto à presença da PM no Campus. Os estudantes são surpreendidos por um cerco formado pela tropa de choque e cavalaria, totalizando mais de 300 integrantes da Polícia Militar. Depois de horas de ação violenta, são retirados do prédio e levados presos mais de 73 estudantes. Camburão e helicópteros acompanham a ação.

O que estes três episódios recentes e lamentáveis têm em comum?

Os três eventos envolvem conflitos na gestão e ocupação do território. Os três são situações complexas, que demandariam um conjunto de políticas de curto, médio e longo prazo para serem enfrentados. Os três requerem um esforço enorme de mediação e negociação.
Entretanto, qual é a resposta para esta complexidade conflituosa? A violência, a supressão do diálogo, o acirramento do conflito.

Alguém poderia dizer — mas por quê os ocupantes do Pinheirinho resistiram? Por que não saíram imediatamente, evitando os feridos e as feridas da confrontação?

Porque sabem que, para quem foi “desocupado” ou” lacrado” nestas e outras reintegrações e “limpezas”, sobra a condição de sem-teto. Ou seja, para quem promoveu a reintegração ou a limpeza, o fundamental é ter o local vazio, e não o destino de quem estava lá, muitos menos as razões que levaram aquelas pessoas a estar lá naquela condição e seu enfrentamento e resolução. “Resolver” a questão é simplesmente fazer desaparecer o “problema” da paisagem.

Mais grave ainda, nestas situações a suposta “ilegalidade” ( ocupação de terra/uso de drogas) é motivo suficiente para promover todo e qualquer tipo de violação de leis e direitos em nome da ordem, em um retrocesso vergonhoso dos avanços da democracia no país.

sexta-feira, janeiro 20

As causas de mortalidade no Bixiga, segundo Adoniran Barbosa


do site do Luis Nassif (http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/as-causas-da-mortalidade-no-bixiga-segundo-adoniran-barbosa)

sexta-feira, janeiro 13

Pra não dizer que não falei da USP


Bom, tentei resistir ao máximo em falar sobre a situação da minha querida Universidade de São Paulo. Devo bons anos da minha vida, lições excelentes de suas aulas e muitas caraminholas que ficaram soltas na minha cabeça. Devo dizer que mais do que construir, a Faculdade de Ciências Sociais fez com que eu descontruisse, além do mundo à minha volta, principalmente a minha visão.

Agora chego ontem em casa, vou ler meus emails e vejo uma notícia com um vídeo de policiais militares entrando no DCE e um idiota de um guardinha barrigudo dar uns pescotapas em um estudante que tava lá.

Sei que tem muito cara folgado, estudante querendo fazer farra com a situação, mas devo admitir a coragem desses caras, injustiçados por esta mídia brasileira, que tantos arrepios me causa, sempre disseminando o que há de mais conservador.

Enfim, posso retomar aqui um papo que tive com um amigo engenheiro (e além do mais, fez engenharia em uma das mais célebres instituições privadas de engenharia de São Paulo). Meio tirando sarro esse meu amigo comentava sobre o meu cabelo, a minha calça de moletom, minha camisa hering furada no ombro e minha sandália de couro dos sábados. Ao final me perguntou: só faltava você ser a favor daquele bando de estudante maconheirinho da USP que invadiu a reitoria.

E daí lhe respondi dizendo que sim. Que na verdade a coisa na USP era mais complexa do que o "Tropa de Elite" poderia explicar. Aquilo era uma discussão maior sobre o papel da Universidade em uma sociedade. E de fato a interpretação da grande mídia era muito ilustrativa do que é São Paulo (na média).

Tentei a explicar a ele que a Universidade deveria ser um espaço de formação do que a sociedade quer vir a ser e cada curso tem que preparar mais adequadamente os seus jovens para o mundo futuro, de acordo com as especificidades de sua área. Por exemplo, um estudante de engenharia tem que aprender a fazer boas pontes, estradas, carros, navios, etc..; O estudante de administração de empresas tem que saber as particularidades de um negócio; o jornalista tem que ter uma visão crítica, neutra (deveria) e saber comunicar de uma boa maneira; e os de Filosofia, Ciências Sociais e História tem o dever de pensar a sociedade, e de mudá-la pra melhor. Enquanto a maioria dos cursos de exatas e biológicas estão preocupados em construir e multiplicar o que já está dado, a ordem vigente, os de Humanas tem que desconstruir a sociedade, estão aqui para questioná-la e a partir de sua visão diferente, tem que mudá-la. E para melhor. Não estão aí para manter a ordem, e sim entender, desconstruir e propor uma nova forma melhor.

Pelo menos é isso o que acho.

Nesse sentido, a coisa que continua acontecendo lá (a de presença de Polícia Militar), além de causar arrepios para a Faculdadade que mais sofreu muito durante a ditadura militar (o prédio da Filosofia, pra quem não sabe, antes era na Maria Antônia, e foi incendiado, teve barricada com os estudantes do Mackenzie em 68), e quem saiu de lá, pra nunca mais voltar, foram os estudantes dessa Faculdade, que até hoje estão em galpões não muito melhores do que os provisórios (sim, dúvido que um grande arquiteto tenha planejado o prédio atual da Filosofia, ele é um arremedo, super frio e feio).
Enquanto o Mackenzie continua onde está, e muito bem, os estudantes das Ciências Sociais da Usp continuam num prédio feio e mal conservado pela administração.Foto da Veja, já na época desse jeito.

Mas o principal em jogo é administração da Universidade de São Paulo, pelo governo do Estado. O ex-governador teve o mérito de descumprir um costume que era uma das poucos coisas mais ou menos democráticas na USP. Me explico, sempre o governador do Estado escolhia o reitor entre uma lista tríplice de professores candidatos escolhidos pela Universidade (não, os estudantes também não podem votar para reitor, é indireto). Mas ainda assim era uma forma de não desrespeitar, tão na cara, a dita autonomia universitária.
Pois bem, o Serra (ai caramba, não gosto de citar esse nome, mas nesse caso, tenho que dar nome ao boi, ou seria burro, ou jumento, ou demo, ou palhaço?), indicou um reitor de fora da lista. Colocou um dos caras mais criticados da USP para reitor, cara que vem fazendo cagada atrás de cagada. E que além de tudo permite e apoia a entrada dos PMs na USP para lidar com os alunos.
Veja bem, quem é da USP sabe. Lá sempre foi que nem a França. Sempre teve greve, todo ano. Não que isso seja bom, mas sempre que os funcionários, alunos, pipoqueiros, sei-lá-quem não concordavam com qualquer coisa: seja com a qualidade do ensino, salário dos professores, ou não permitir que o metrô entre na USP (sim, esse reitor não permitiu isso, disse que teria gente demais!), ou que se referisse ao golpe de 64, como "revolução", tinha greve. Aí pára tudo, ocupa a reitoria, faz assembléia, chega a um acordo e a universidade segue. É o que se chama de democracia.
Daí colocar PMs para negociar as manifestações não é certo. PM tem que cuidar de segurança, não de manifestação da USP (a discussão sobre tráfico, consumo de maconha, posso fazer outra hora). E o reitor, tem que sentar com todo mundo, negociar e melhorar a Universidade (para melhorar a sociedade que se quer). Enfim, é mais ou menos isso.
Essa discussão na minha opinião é mais ampla. Estive na Cidade do México há poucos meses e passei por um bairro de lá, que eles chamam de Cidade Universitária. É onde estão todas as Faculdades, com alojamentos de estudantes, arborizado, etc. Digo isso para comentar que era um bairro, não era cercado, fazia parte da cidade! O que se está fazendo na USP é fechá-la cada vez mais! Não deixa o metrô entrar, tem muro, tem guarda pra bater nos estudantes, e tem um monte de favela do lado que não se comunica com a USP, as pessoas que pagam imposto não podem andar de bicicleta, jogar bola e fazer piquenique lá de domingo, etc. Tinha que derrubar esses muros e permitir que a Universidade seja aberta à cidade, de verdade.
Daí a minha segunda observação: uma outra forma de integrar a universidade com a sociedade é obrigar que cada estudante doe seu último ano para a sociedade. Aumenta em um ano cada curso e obrigue os estudantes formados aí a trabalharem para a comunidade durante um ano, de acordo com a sua formação. O arquiteto e sociólogo vão trabalhar na favela, o engenheiro vai construir as casas populares, jornalistas em rádios comunitárias, médicos dariam plantão nos postos de saúde, etc... Já que a Universidade faz parte do governo, integra os estudantes ao serviço público, para aprender na prática o que é esse país, aplicar seus saberes, humanizar um pouco sua visão de mundo.
Porque não?
Ao final cito aqui uma frase que me perseguiu durante os quatro anos na USP, e que resistia bravamente ao tempo. O que de fora poderia ser uma mera pichação (os engenheiros que passavam com seus carros por ali deveriam pensar isso), era uma lição que demorei pra entender o significado e guardei na cabeça e no coração. Estava pichado em vermelho, na frente do prédio da Sociais da minha época: "A não preocupação com as finalidades sociais do conhecimento produzido se constitui em fator de delinqüência acadêmica".

PS: essa era uma frase do Mauricio Tragtenberg, professor da PUC, importantíssimo cara, do texto " A delinquência acadêmica" (http://www.espacoacademico.com.br/014/14mtrag1990.htm).

quarta-feira, janeiro 11

Fala Craviola

Bem que atualmente poderia mudar o nome do Blog, porque nas minhas férias aproveitei meu tempo livre, meu décimo terceiro e fui às compras na Teodoro. No dia tinha ouvido uma música do Django Reinhardt, e fiquei com ela na cabeça, martelando e assobiando o dia inteiro. Foi quando eu, subindo a Teodoro Sampaio (onde tinha ido comprar um songbook do Django) vi um instrumento de corda bem diferente, com uma boca meio de meia-lua, mas parecia um pouco instrumento medieval, bem diferente. Mas bonito. Perguntei pro vendedor que disse alguma coisa, um pouco dando a entender que o instrumento tava meio encalhado na loja. Mesmo assim pedi pra tocar. Corda de aço, som meio metálico. Adorei. Saí de lá com aquele nome engraçado na cabeça. Uma tal de Craviola. Entrei num café que tinha wifi e fui procurar mais informação sobre isso. Aí que gamei de vez. Era um instrumento que tinha sido desenhado pelo Paulinho Nogueira, um dos meus violonistas preferidos. Vizinho meu. Muito familiar. A pedido do Paulinho (que antes de violonista, tinha tentado ser desenhista) tinha sido executado pelo Gianini. O formato do instrumento interferiu no som. É um som meio diferente, segundo ele lembrava viola ou um cravo. E aí ele gostou, batizou de Craviola. O Gianini patenteou e existe desde então, disponível para todo e qualquer brasileiro que se preze. Parece que tem um disco do Luiz Bonfá só tocado em Craviola e tem outro do próprio Paulinho Nogueira. Bem interessante. Conhecia o Paulinho Nogueira do meu bairro. Ele morava do outro lado do Parque da Água Branca, quando ainda existia famílias nas ruazinhas da água branca. Encontrava com ele na padaria, no banco, na Sul Mineira, e minha mãe sempre apertava minha mão e falava: esse é o Paulinho Nogueira. Pra mim ele era conhecido bem antes do que suas músicas. Sabia que ele era importante, mas mesmo antes de saber que era violonista, amigo e professor de meio mundo (entre eles o Toquinho, que está nesse vídeo), compositor. Sabia que ele era um velhinho simpático que sempre acenava, e que minha mãe achava ele importante. Só pela maneira como ela apertava a minha mão quando ele passava. Enfim, uns dez anos depois, quando comecei a estudar seriamente violão dei de cara com a Bachianinha, música dele. Uma das minhas preferidas em todos os tempos. Daí realmente vi o tamanho do cara. Desde então, já quando ia correr no Parque da Água Branca e encontrava com ele, já mais velhinho (mas sempre elegante) andando nos meios das alamedas em tardes de dia de semana, diminuia a passada, acenava pra ele com a cabeça super respeitavelmente, quase me curvando como se fosse uma homenagem a um nobre. E ele devolvia o aceno. Enfim, hoje continuo homenageando ele diariamente. Agora com a Craviola. 

Dr.

Demorei aqui para escrever sobre o Sócrates, sempre tão citado desde o começo do blog. Tive o prazer de vê-lo jogar desde pequeno. Me lembro do primeiro jogo do Corinthians que fui assistir no estádio, com meus primos, meu pai e meu avó, no Morumbi. O refrigerante e a cerveja eram vendidos naqueles copos gigantes, que mais se pareciam pratos fundos de plástico. Meu vô, como sempre, pediu amendoim doce.
Desse dia lembro de algumas sensações: meus primos e meu irmão gritando o nome do Sócrates (que eu não conseguia falar direito), meu pai comentando o jogo com meu avô e eu com uma bandeira que tinha acabado de ganhar.
Lembro do Solito e do Biro-Biro também. Mas tudo é meio nebuloso na minha cabeça. Mas é daí minha primeira camisa do Corinthians, que tinha o número 8, o meu número e do dele.
Só agora que consigo digerir a última partida que vi no estádio, contra o Palmeiras, no Pacaembú, que deu o título ao Corinthians. Acordei de manhã com a mensagem de um companheiro corintiano, que me falava sobre a morte do Sócrates. Fiquei sabendo daquilo ainda na cama, antes de lavar o rosto. Puta tristeza.
Mas o nervoso para a partida final do campeonato contra o Palmeiras sublimou um pouco a tristeza até o minuto de silêncio, quando todos os jogadores levantaram o braço que nem ele fazia. A torcida também, como se fosse combinado, levantou o braço junto. Mais de 30 mil pessoas.
Eu chorava e tentava não soluçar, mas o pessoal do meu lado notou. Limpei rápido as lágrimas e quando o jogo começou todos berramos. Até o final.
Depois não poderia ter homenagem melhor ao Sócrates do que tomar uma cervejinha para comemorar. Tomar um porre.
O Sócrates foi importante, porque foi uma das poucas pessoas que passaram pela minha vida sem nunca ter me decepcionado. Foi, mesmo quando não concordava com o que ele dizia, coerente. Coerente com seu discurso, formação e história. E fez escolhas muito importantes em momentos críticos. Era muito mais do que um jogador de futebol.
Ídolo até o final.

Chico em forma

Putz, como ninguém lê isso aqui mesmo posso me dar o direito de ser repetitivo. Continuando com Chico, e ao ouvir o cd novo dele nos últimos tempos, detidamente e repetidamente, dá pra notar que ele ainda bate um bolão.
Entre as categorias buarquianas, me detendo só na de duetos, que vem de desde "Com açúcar e com afeto", passando por "Noite dos mascarados", "Baioque", "Sem fantasia","Biscate", ele criou uma no mesmo nível das outras, neste último disco, com nova parceira, a "Se eu soubesse", linda, linda. Vejam só, coisa meio Cole Porter.

Mesmo assim a minha preferida ainda é a obscura e não muito tocada "Dueto", com a melhor parceira de dueto dele, na minha opinião. A Nara.

terça-feira, janeiro 10

Todo o Sentimento

Chico e Paris.
É mole ou quer mais?

sábado, dezembro 31

Haikai Escondidinho



Como felino

antes do bote, sou Leão

Te cuida 2012

sexta-feira, dezembro 30

Música e amor

Tá aqui uma das minhas cenas preferidas do cinema, em todos os tempos. Pelo visto e pela seleção disponibilizada no youtube, não estou sozinho.
Pra variar, é um filme meio obscuro do Woody Allen, que nunca aparece na lista dos melhores dele, mas para mim é sim.
Além da música ser bonita e ser violão instrumental, a historinha da cena é muito bonita. O personagem do Sean Penn é um guitarrista genial, mas um desses caras que só consegue se expressar inteiramente de uma maneira harmônica e virtuosa por meio da música, esquema meio João Gilberto. Fora isso tem o fundo machista da época e o fato da menina, que está na cena e vai virar par dele no filme a partir daí, não falar. Por isso ele não a considera muito (e por isso quando pergunta a sua música preferida, na mesma hora se corrige, como se ela não fosse capaz de gostar de música). Uma dessas tantas insensibilidades desequilibradas das pessoas hiper sensíveis.
No momento em que ele começa a tocar "I'm forever blowing bubbles", de uma forma super especial, sem letra, só com a música saindo dele, parece que ela descobre a beleza, de uma maneira mais ampla.

Enfim, a arte não se explica muito. Vale mais a pena ver.

sexta-feira, setembro 30

Corinthians ideal

Bom, antes de tudo meu Corinthians ideal teria um presidente como o Sócrates, teria uma política de formação de ex-jogadores como técnicos, que iriam subindo de categoria de acordo com sua evolução e teriam em todos os níveis o mesmo esquema, acostumando os meninos da base com a mesma maneira de jogar (como Boca e Barça já fazem).

Continuaria jogando no Pacaembú, só que com preços populares (máximo 5 reais e sem divisão de torcida), teria uniforme sem patrocínio, de algodão e com meia zebrada, destinaria todos os recursos para a formação das categorias de base, com escola, formação cidadã e humanística e sensibilidade social para os jovens, que seriam selecionados de acordo com sua técnica e habilidade, não pelo tamanho ou pelo empresário.

Mas como estamos sonhando e ainda não podemos destacar grandes craques que nascem da base, digo aqui, de sopetão, o meu time ideal do Corinthians hoje (Casagrande de coordenador técnico geral, Neto de gerente de futebol e Basílio, pouca moral, de técnico):

Renan (sim, daria chance pra esse cara, que antes era convocado para a seleção, fechava o gol enquanto estava no Avaí, e foi queimado pelo Tite), Maikon na lateral direita, Sebá e De Sábato (dois beques argentinos e botinudos, como reza a tradição corintiana desde Embú, Baré, Dama, etc.) e Kléber na esquerda (que saiu, mas nunca deveria ter saído).

No meio o Hernanes, como único volante (bambi, mas bom), Oscar e Ganso de meias tradicionais. Na frente Kléber Gladiador (da Fiel), Herrera (a cara do Curíntia) e Carlito, só pra marcar na pressão, o jogo inteiro.

Nada é mais bonito.

2014 agora

Bom, depois do único jogo um pouco mais empolgante que a seleção brasileira fez, cravo aqui, dois anos e oito meses antes, a minha seleção de 2014:

Goleiro:
Jefferson, Botafogo (titular)
Júlio César, Inter de Milão (reserva)

Lateral-direito:
Maikon, Inter de Milão (titular)
Adriano, Santos (Reserva)

Zagueiro Central:
David Luiz, Chelsea (titular)
Luisão, Benfica (reserva)

Quarto Zagueiro:
Tiago Silva, Milan (titular)
Dedé, Vasco (reserva)

Lateral-esquerdo:
Marcelo, Real Madrid (titular)
Kléber, Internacional (reserva)

Primeiro volante:
Lucas, Liverpool (titular)
Ralf, Corinthians (reserva)

Segundo volante:
Hernanes, Lazio (titular)
Elias, Benfica (reserva)

Meia esquerda (sim, minha equipe joga com dois meias, de 4-4-2 tradicional do Brasil):
Ronaldinho Gaúcho, Flamengo (titular)
Oscar, Internacional (reserva)

Meia direita:
Kaká, Real Madrid (titular)
Ganso, Santos (reserva)

Atacante (que flutua):
Neymar, Santos (titular)
Lucas, São Paulo (reserva)

Centroavante (mais fixo):
Leandro Damião, Internacional (titular)
Adriano-Imperatório-dando-a-volta-por-cima, Corinthians (reserva)

Bom, em dois anos, quero a cobrança. E se o técnico da época não escalar estes e o Brasil não ganhar pelo menos avisei. Falei e disse.

terça-feira, setembro 27

Perdi alguma parte?


Com todo respeito e amor que tenho aos meus amigos judeus, que são muitos e queridos, aqui separo a nação judaica do Estado de Israel. Atualmente quando discutimos o reconhecimento da ONU para um Estado Palestino, isso me parece um pouco anacrônico.
A própria criação do Estado de Israel, assim como o da Palestina, não foi proposta pela própria ONU em 1947?
Depois de todas as invasões de Israel desde então e perda dos territórios palestinos, por acaso a ONU reconheceu as invasões israelenses? Que eu saiba não.
Então porque a ONU tem que reconhecer o Estado Palestino de novo?
Na verdade ela alguma vez na história reconheceu as invasões israelenses como legítimas?
Se não, não há o que reconhecer, aprovar ou vetar.
O que a ONU deve manter é a sua decisão de 1947: a criação de dois Estados. O de Israel e o da Palestina. Isso nunca foi desdito. Portanto deve ficar o dito.
O resto é pura balela e desinformação.

segunda-feira, setembro 5

sexta-feira, agosto 26

Novo disco do Chico

Artigo excelente sobre o novo disco do Chico!
Pra quem quiser saber tudo sobre esse disco acessar http://www.chicobastidores.com.br

Arthur Nestrovski / ESPECIAL PARA O ESTADO

Não tenha pressa. A arte é longa e a vida é breve, essas canções vão durar pra sempre e nosso tempo é curto (como diz o narrador-personagem da faixa 3), mas por isso mesmo não pode haver meia hora melhor gasta do que essa, ouvindo cada história, cada pequeno romance, cada poema cantado, com a devida atenção¹.

Ouvir com atenção, por sinal, é o que as canções mais pedem; e era disso mesmo que falava Chico na notória entrevista de 2004, sobre "o fim da canção".² Como acontece tantas vezes, o que ele falou foi uma coisa e o que disseram do que ele disse, outra. Chico jamais falou que a canção ia acabar. O que ele disse é que certo modo específico de fazer canções, a combinação minuciosa entre palavra e música, numa tradição que tem em Jobim e Vinicius seus modelos, não goza mais da popularidade que já teve; e que essa arte maravilhosamente brasileira de compor canções talvez ainda venha a ser vista, num futuro mais ou menos próximo, como uma forma musical e poética cujo período mais vibrante terá sido o século passado. O que não significa que não haja mais ninguém compondo canções assim, nem que muito do melhor não esteja, quem sabe, por vir.

Na sequência, em 2006, o próprio Chico lançou o CD Carioca, que já bastaria, por si, para reforçar a aposta. Aquele disco pode ser visto como uma verdadeira galeria de gêneros (choro, samba, valsa etc.), cada um levado ao limite, num sentido figurado tanto quanto técnico. Só as harmonias cromáticas do choro de abertura, preenchendo cada espaço do campo tonal, já demonstravam a maestria do compositor nesse "fim" de uma era. Ele ali parece disposto a levar as coisas até onde possível, preservando e transformando Jobim, tanto quanto Vinicius. Tudo isso sem perder de vista o que se passava, naquele dia e hora, para além dos encantamentos da poesia e da música, e para além dos encantamentos do coração, bem na cara de quem sempre pôs o pé na rua, e nunca fingiu que não vê o que não dá pra não ver.

Cinco anos e um romance (Leite Derramado) depois, Chico chega ao Chico; e dizer que ele chega a si não seria nada justo, depois de o Chico ser o Chico há tanto tempo. Mas o depuramento e ao mesmo tempo o virtuosismo, o controle e o puro prazer de escrever letra e música, e de cantar canções, chega aqui a um ponto que faz por merecer a simplicidade definitiva do próprio nome - um dos nomes mais comuns no Brasil, mas que há muito tempo, dito assim, solto, todo mundo sabe que só pode ser o Chico Buarque.

Ninguém como ele mesmo percebe melhor a diferença entre esse Chico público, um espírito da música e da poesia que hoje virou patrimônico coletivo, e o homem íntimo, que se confronta com o papel em branco a cada vez que vai escrever uma letra. O tema da duplicidade, somado à comédia ou farsa da celebrização, já era o grande assunto do romance Budapeste; e ganha agora outra versão em "Rubato", parceria com o baixista Jorge Helder, co-autor também de "Bolero Blues", no disco anterior.

"Rubato" é um termo técnico, uma indicação para tocar fora do pulso metronômico exato, dando mais expressividade a algum trecho. A ironia já começa aí, porque nessa canção a melodia de mil ângulos imita ritmos imprevisíveis da fala, e só quem estiver controladissimamente a tempo será capaz de não perder o rumo expressivo do canto. Que o poeta também tenha sido capaz de achar uma sílaba precisa para cada nota constitui outra façanha. Mas a maior ironia se vai ver mesmo na letra.

Na primeira estrofe, o poeta diz à sua Aurora para vir depressa ouvir, antes que "um outro compositor... roube e toque e troque as notas no songbook", estragando tudo e expondo o seu amor na televisão. Isso só para na segunda estrofe o mesmo apelo para ouvir "nossa música" já vir da parte de quem está "roubando de outro compositor". Mas será que este já não era o autor da primeira? A essa altura, Aurora virou Amora, que vai virar Teodora na terceira estrofe, composta, quem sabe, por um segundo ladrão, que terá certamente seus cem anos de perdão, à medida em que as canções forem se transformando umas nas outras, como afinal se transformam todas as canções.

Se a palavra "rubato", em italiano, quer dizer "roubado" (musicalmente, "tempo roubado"), isso só engrossa ironicamente o caldo de traições e roubos, de identidades e autorias trocadas que eram a própria essência do romance Budapeste. E será que não dá, pelo menos de brincadeira, para imaginar o memorável ghost-writer José Costa cantando aqui, tresdobrado sobre si mais uma vez?

No extremo oposto do CD, na penúltima faixa que espelha esta segunda, a própria canção se recria, ou se rouba, agora em forma de irresistível samba, "Barafunda": "Era Aurora/ Não, era Aurélia/ Ou era Ariela/ Não me lembro agora..." E quem será que está ali cantando, nessa canção em que mulheres apaixonantes do passado - incluindo, impossivelmente, a Ariela de Benjamin - vão se confundindo com grandes craques de futebol, em lembranças mal desfiadas que também abrem espaço para fulgurações da História e exultações de carnaval?

Alguém tem dúvida? Só pode ser aquele campeão do esquecimento seletivo, o inesquecível ancião Eulálio, de Leite Derramado, cujo monólogo vê-se agora roubado e transformado em samba-do-crioulo-doido, em que se cruzam paixão, futebol e política. Mas este é um Eulálio feliz, reencarnado em Elza Soares (já que a canção cita diretamente "Dura na Queda", escrita para Elza) e com direito até a uma aparição da musa Maristela.

Em retrospecto, a forma do disco se desenha assim, em espelho. São oito canções de amor, de "Rubato" (que alude a Budapeste) a "Barafunda" (que evoca Leite Derramado). Cada uma num gênero:

Faixa 2: marchinha -- marchinha de vanguarda, mas marchinha, com banda de coreto e tudo.

Faixa 3: blues, introduzindo outro grande tema do disco: a paixão do homem mais velho pela menina moça. Em "Garota de Ipanema", como em "Bolero Blues", essa era uma paixão sonhada, frustrada. Agora, vivida e assumida, sem se levar a sério demais, com uma leveza e uma graça que dão encantamento a quase tudo no disco.

Faixa 4: baião -- de vanguarda, modulando cromaticamente por meio-tom, mas baião. Para ser mais preciso: uma canção meio sem gênero, quase recitativo, que vai sonhando com um baião até que consegue virar o próprio.

Faixa 5: canção francesa, narrador e narrada cantando afinal juntos, namorando em tom maior, cromatismos e curvas, delícia. Participação mais que especial da cantora Thais Gulin.

Faixa 6: adágio jobiniano, o nome fala por si: "Sem Você 2", melodia plangente e harmonias que vão caindo, caindo, caindo.

Faixa 7: Samba de gafieira, parceria com Ivan Lins, aqui com a participação vocal do impagável Wilson das Neves (parceiro do Chico na já clássica "Grande Hotel").

Faixa 8: valsa russa, em que Chico incorpora o Google Maps ao acervo da nossa lírica (assim como já introduzira o orelhão, em "Bye, Bye Brasil" e a secretária telefônica em "Anos Dourados", sucessivos avanços na tecnologia do recado amoroso).³

Os arranjos, sempre na mão de Luiz Cláudio Ramos, sutilizam o mundo sonoro dos últimos três discos, de modo um pouco mais concentrado e discreto, mas talvez por isso mesmo ainda melhor resolvido. Em torno à banda de base -- violão de Luiz Cláudio, piano de João Rebouças, baixo de Jorge Helder, bateria de Jurim Moreira --, comparece o clarinete de Paulo Sérgio Santos aqui, a harpa de Cristina Braga ali, o violino de Nicolas Krassik, o acordeão de Marcos Nimrichter, a guitarra de Frado e o violão de João Bosco acolá, entre outros convidados, cada um no ponto preciso e necessário, quase nunca repetido. As canções, aliás, quase todas, também não são cantadas mais do que uma única vez, do começo ao fim e pronto. Cada uma é como um poema num livro, que se pode ler quantas vezes quiser, mas nem por isso precisa ser grafado de novo.

Essas oito canções, que vão passando de uma a outra como contos de Sheherazade, ficam emolduradas pela primeira e última músicas do disco. Tantas boas emoções, tanto prazer em inventar e viver histórias, tanta delícia de compor e cantar, tamanho gosto de vida, espalhados entre as faixas 2 e 9, ficam postos em devida perspectiva com essas outras duas, que vêm antes e depois.

O disco abre com uma toada, "Querido Diário", entoada por um personagem que entra de cara para o acervo das grandes criações do Chico, captando disfunções sociais do Brasil com uma antena que só ele tem. Ganha voz agora o miserável que vai pelas ruas, recebendo "fica com Deus" dos "conhecidos", traçando seus descaminhos pela cidade barulhenta, acompanhado de um cão raivoso, pensando em "ter religião" e amar uma mulher "sem orifício", amando obscura e violentamente uma companheira de carne e osso, afinal castigado a porretes pelo "inimigo", mas resistindo a tudo, "macio".

Nesse ponto, cabe um comentário musical. Cada uma das cinco estrofes começa em dó maior, vai traçando um percurso cromático, primeiro para cima e depois para baixo, e termina em dó menor (na palavra "sozinho", por exemplo, final da primeira estrofe; ou "pedaço", no final da segunda)4. Tonalidades maiores tendem a soar mais abertas, luminosas, positivas; tonalidades menores são o contrário. E no arco do disco o que se escuta na última faixa, um afro-samba em parceria com João Bosco, fará a versão espelhada dessas modulações.

As harmonias, nesses casos, precisam ser compreendidas junto com as letras, que elas ao mesmo tempo refletem e nutrem. O disco começa por um fim; quer dizer, por onde estamos agora: a miséria escancarada, que não se quer reconhecer, mas está aí em cada esquina. Na alegoria musical encenada por esses dó maior e dó menor, a aparente "cordialidade" das circunstâncias -- aqui cantadas em dó maior -- pede para ser compreendida naquele contexto identificado desde a década de 1930 pelo pai do Chico, um contexto caracteristicamente brasileiro, marcado pelo recalque de suas próprias violências -- ressoando em dó menor.

Tentando ser mais claro: algo se esconde nas alegrias reais ou assumidas do dó maior: são as dores do dó menor, e o balanço entre uma e outra tonalidade parece ali realizar em termos puramente musicais uma oscilação de fundo na nossa formação.

A interpretação pode soar redutora; mas veja-se a última canção. O disco termina por onde tudo começa: na trama da escravidão, núcleo recalcado de violências que vão se repondo, sem fim, na história do país. A cena é chocante: quem canta -- não por acaso, em dó menor -- é um negro preso ao tronco, prestes a ser açoitado e cegado pelo senhor de engenho, depois de ter visto (ou não visto) sua "sinhá" nua no açude.

Leite Derramado já explorava obsessivamente as formas como a herança da escravidão se dispersa e se recalca, e continua por aí, em mil nuances, reconhecidas ou não. Continua inclusive aqui -- em subitamente luminoso dó maior --, no "cantor atormentado" que surge na última estrofe e revela o segredo inconfessável da história: é ele mesmo o "herdeiro sarará/ do nome e do renome/ de um feroz senhor de engenho" e -- de volta ao dó menor --, bem lá na origem escondida de tudo, herdeiro "das mandingas de um escravo/ que no engenho enfeitiçou Sinhá".

Só um compositor tão ciente de seus meios, seja na música seja na poesia, arma suas invenções assim. Tudo está posto: o Brasil se entende, afinal, nessas canções. Que elas sejam também criadas sobre uma simples alternância entre tom maior e menor, dão a dimensão do Chico compositor, ou mais especificamente, do Chico criador de canções, em que poesia e música estão indissoluvelmente ligadas.

Haveria muito mais para ser dito. Valeria a pena chamar a atenção para os vários momentos em que as canções como que deixam de ser canções cantadas, retornam ao ritmo natural da fala (de onde todas elas vêm), só para voltar depois, gloriosamente à música. É o que se escuta, por exemplo, quando Chico canta o verso "Tipo pra vida inteira", em "Tipo um Baião", ou "...a casa/ A roupa que ela usa, as mechas, a tiara/ Posso adivinhar a cara que ela faz", em "Nina".

Valeria também a pena falar das rimas ( "sobra/ abóbora", "acorda [com "r" rolado]/ Flórida", "pinta a boca e sai/ take your time", para ficar só em exemplos de "Essa Pequena") e das palavras e expressões preciosas ("Cazaquistão", "Barbarella", "song book", "a mó de me quebrar", "a bola entrar na gaveta").

A pequena introdução sem letra de "Se Eu Pudesse" provoca uma alucinação, dá um frio na espinha: é o Tom cantando. Mas não é Tom, é Chico mesmo, que ali carrega o Tom na voz de modo comovente. E já que estamos nisso, valeria muito a pena estudar as artes do cantor Chico Buarque. Entre tantos lugares-comuns que foram se formando ao longo do tempo, tem esse do Chico "compositor que canta", eufemismo para dizer que não canta. Oxalá todo compositor não cantasse assim! Para começo de conversa, quase ninguém escande musicalmente uma letra como ele. Ampliando uma sílaba aqui e encurtando outra ali, acentuando ou amaciando palavras, Chico nesse disco dá uma verdadeira aula. Sem falar no carisma da voz, que a gente reconhece em qualquer larará, lariri.

Mas o tempo, como disse o cantor da faixa 3, é curto, a vida breve e a arte é longa. Dizer que neste Chico o Chico chega a si seria injusto. Mas dá para ver o disco como um renovado resumo dos principais temas e principais recursos musicais e literários do compositor, escritor, poeta e cantor Chico Buarque ao longo dessas últimas duas décadas, marcadas pela publicação de quatro romances intercalados com três discos. Quem acompanhou essa produção sabe o que representa, tanto em termos musicais quanto literários, como expressão de nós mesmos e estímulo para pensar e viver o Brasil.

Quem não guardou essas canções e romances para si, quem não fez do que o Chico fez um acervo pessoal e precioso? Cada um de nós se tornou, com ele, o ghost-compositor de canções que não são mais só dele, são de todos nós e de nenhum de nós. Este novo Chico nos confere mais uma vez o privilégio de ser, por meia hora e eternamente, Chico Buarque. Cada um de nós, por meia hora, será Chico Buarque cantando tormentos e glórias, festejando o que pode ser festejado e cuidando do que pede atenção. A penúltima palavra fica com o velho cantor: "salve este samba/ antes que o esquecimento/ baixe seu manto/ seu manto cinzento". E a última palavra, e o último dó, nos leva de novo até o começo, para repetir o trânsito por este disco sem fim.

* Arthur Nestrovski é diretor artístico da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp). Compositor e violonista, lançou, entre outros, os discos Jobim Violão e Chico Violão (Biscoito Fino) e os livros Notas Musicais e Outras Notas Musicais (Publifolha).

1. Este ensaio tem por base um pequeno texto escrito por encomenda da gravadora, para ser distribuído junto com os materiais de divulgação do CD Chico.

2. "O Tempo e o Artista: A Canção, o Rap, Tom e Cuba, Segundo Chico." Entrevista a Fernando de Barros e Silva. Folha de S.Paulo, 26/12/04. Disponível no Acervo Folha e também em www.chicobuarque.com.br

3. Sobre esse assunto, ver o ensaio de José Miguel Wisnik e Guilherme Wisnik, "O Artista e o Tempo", no vol 2. do Songbook Chico Buarque (Lumiar, 1999), reed. em José Miguel Wisnik, Sem Receita (Publifolha, 2004).

4. A rigor, uma primeira inversão de lá bemol com sétima maior, mas o mais importante aqui é a sensação de acorde menor alterado, sobre o baixo de dó.

segunda-feira, agosto 22

Todo se transforma


Ele se levantou automaticamente, pôs as meias de olhos fechados, vestiu o agasalho e enrolou o cachecol.
Saiu acordando, arrancou o carro bocejando, triste por saber que se fazer entender não é fácil. Triste por fazer pessoas queridas, tristes. Mas isso tudo era para o melhor, ele sabia.
A vida tem dessas coisas e às vezes o sofrimento traz no futuro boas coisas. Era nisso que ele acredita. Nada como um dia após o outro, ele, que já levantou e caiu tantas vezes, pensou.
Ligou o ipod no carro. Com aquela chuva não queria ouvir sobre trânsito. Ele já percebia o trânsito pela sua janela.O ipod estava no "shuffle" e, enquanto ele abria o olho direito e tomou um gole de água, a música começou a tocar.

"Supe que de algún lejano Rincón, de otra galaxia, El amor que me darías, Transformado, volvería, Un día, a darte las gracias."

Se sentiu conformado, pois mesmo sendo cético em relação às coisas, sabia que a vida dá um sentido a tudo. Seja aqui, na via láctea ou em qualquer lugar, "Cada uno da lo que recibe, Y luego recibe lo que da, Nada es más simple, No hay otra norma: Nada se pierde, Todo se transforma."

Depois disso a água só continuou caindo do lado de fora do vidro do carro.

terça-feira, março 15

Água Branca

Quem me vê assim, andando na rua, não deve imaginar de onde vim. Não tenho bronzeado nem me visto como gringo, não tenho a malandragem de carioca, não tenho a calma do baiano, não tenho cabelo de gaúcho e não tenho sotaque de mineiro.

A falta de uma característica típica me leva um pouco para o lado dos paulistanos, que são um pouco sem cara mesmo, tem de tudo.Mas se formos pensar como paulistanos, não tenho as expressões nem o cantar da Moóca, não tenho o sofrimento no olhar de periferia tampouco. Não tenho estilo quatrocentão de Higienópolis ou dos Jardins, não tenho faccia de executivo da Berrini.

Mesmo já tendo morado na Cardoso de Almeida e estudado na PUC, acho que não tenho cara de Perdizes também. Quando vejo as senhoras arrumadas e seus filhos de uniforme, ou os adolescentes na PUC, não me assusto, é muito familiar, mas também não me identifico com isso, ainda me sinto estrangeiro.

Sou de um lugar que já não existe mais. Um pedaço de cidade de um máximo 5 quarteirões quadrados, mas que para mim é uma espécie de Rosebud. Não importa quão longe eu chegue ou tão longe eu vá. Mesmo se estiver nas cochinchinas da China, ou comendo carnes uruguaias, ou passando frio na Dinamarca, ou tentando arranhar um alemão em Stuttgart, sei que alguma hora terei que voltar para ver se minha casa ainda está de pé, ainda está lá, mesmo que sem a árvore, mesmo que desfigurada.

Posso participar de coisas um pouco vergonhosas ou muito importantes, mas dou um jeito de mudar a rota dos caminhos para passar por lá, para ver como vão as coisas. Para ver de onde vim, para não me esquecer de mim.
Talvez ninguém me entenda. Talvez só quem desceu a Germaine de bicicleta ou skate, quem comeu pastel na Costa Júnior (e sabia onde era casa que era do Sangirardi), quem comprou pão na Tanabi, quem cumprimentou o sonolento seu João, quem experimentou o picolé do seu Décio, quem conhecia as casas pelas referências das famílias que lá moravam (o delegado, a psicóloga, a Dona Valdira, etc.), quem já foi pedir a bola pra Dona Elídia jogar de volta, quem chupou chupeta na Melo Palheta.

segunda-feira, dezembro 6

Buenos Aires - do Laio para o Nardini

O email até parece uma letra de música (idéia para os músicos).
A dica (não autorizada) foi para uma viagem de 4 dias.
Com o tempo vou acrescentando coisas aqui também (assim como fotos, nessa série de dicas...).
Quem quiser que conte outra:


Fala Nardei!

Vamos lá, em quatro noites, o que eu acho imprescindível:

Palermo Viejo é o canto mais legal de Palermo.
Também é conhecido como Palermo Soho, por causa das semelhanças com o Soho e o Village de NY. É um centro gastronômico, com bares e restaurantes estilosos, baladinhas, galerias de arte, salas de teatro alternativo, casas de decoração, lojinhas etc.

Puerto Madero tem restaurantes mais grã-finos. Como vc é meio playboy, vai gostar.

A Recoleta, lembro que é legal, mas não lembro o que tem lá...

Na Boca tem que ir, dar um rolê e almoçar por lá. Obrigatório. Tem um restaurante lá perto, "El Obrero", que é muito bom. A visita ao estádio é meio mala. Ver um jogo lá, é classe A. Mas como vc estará com a mulher, não recomendo.

Teatro Colón é o teatro mais legal que já fui. Vale a visita guiada e assistira algo à noite, se der.

Como são poucos dias, vale um city tour, para passar na Casa Rosada, Obelisco, esses pontos turísticos principais.

O melhor museu é o Malba, na Av. del Libertador. Sempre tem exposições legais por lá.

Café Tortoni pode ser bem turístico, mas é legal. Tem shows menos turísticos lá tb. Tem que se informar.

Se calhar, tente ver em algum lugar: Orquestra Típica Fernandez Fierro (tangão tradiça lado B, repaginado), Fito Páez e Gabo Ferro (pops legais) e Tanghetto e Narcotango/Carlos Libendinsky (tango eletrônico não muito afetado).

E tem mais coisas. Mas são poucos dias, né? Santei complementa pois conheçe a cidade melhor que eu.

Abração, beijo pra Carol e boa viagem.

Laio